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Desconhecimento ainda cerca endometriose, doença de Lena Dunham

20/02/2018

Quando vejo a endometriose virar assunto, sinto como se alguém me dissesse que tem uma notícia boa e uma notícia ruim para me dar. A boa é que, de tão raros que são os debates na imprensa sobre o assunto, qualquer registro já aumenta a esperança de que a doença se torne cada vez mais conhecida e, portanto, recebe mais atenção e cuidados. 

 

Esta semana, a atriz e roteirista Lena Dunham, 31, da série "Girls", anunciou que passou por uma histerectomia --cirurgia que retira o útero-- por causa das fortes dores que sentia devido à endometriose. Assim como Lena, eu também sofro com a doença há décadas, embora só tenha recebido o diagnóstico certeiro há pouco menos de um ano --tenho 37.

 

E, assim como Lena, também fui operada. Em nenhuma das sete cirurgias que fiz apenas em 2017 por conta do problema, porém, fui submetida a algo tão radical quanto ela. Perdi um ovário, uma trompa e um pedaço do ureter, sim, quase perdi também um rim, mas meu útero continua por aqui. A cura da endometriose não acontece só com a retirada do órgão --e esta pode ser a notícia ruim do caso Lena.

 

"A endometriose não está dentro do útero, ela está fora", diz o médico Eduardo Schor, professor do departamento de ginecologia e chefe do setor de endometriose da Unifesp. A doença se manifesta quando o endométrio, tecido que reveste internamente o útero durante o período de ovulação, espalha-se para outros lugares do corpo e pode atingir bexiga, intestino e ovários.

 

Por isso, retirar completamente o útero não resolveria, a princípio, o problema. "Há detalhes que desconhecemos no caso de Lena, mas a histerectomia é mais indicada para a adenomiose, doença na qual o endométrio se implanta na parede do útero", diz Maurício Abrão, professor associado do departamento de obstetrícia e ginecologia da Faculdade de Medicina da USP e responsável pelo setor de endometriose do Hospital das Clínicas.

 

Schor  diz que é frequente ver, em ambulatórios, mulheres  por  volta dos 25 anos,  solteiras, sem filhos como Lena, implorando pela retirada do útero para tentar solucionar as dores da endometriose. "Temos que ter cuidado com isso", diz Schor. "Quando se tira o útero, a preservação dos ovários é discutível. Mantê-los aumenta as chances de a mulher ter a doença de novo, mas a retirada leva a uma menopausa abrupta, diferente da natural, e muito sintomática." De novo: ótimo que possamos falar sobre a doença publicamente, mas é uma temeridade imaginar que mulheres tão novas possam pensar que esse é o único recurso para acabar com o sofrimento.

 

DOR INSUPORTÁVEL

 

Quando digo sofrimento, aliás, talvez esteja sendo até branda demais com o que vivem as portadoras de endometriose. Se as cólicas mensais vividas pelas mulheres que não têm a doença já incomodam, aquelas que nós sentimos diariamente beiram o insuportável. Da primeira vez em que tive uma crise, aos 21 anos, fui parar na emergência, onde me arrancaram o apêndice, que supuseram que estava infeccionado.

 

A Organização Mundial da Saúde estima que quase 180 milhões de mulheres enfrentem a endometriose no mundo --só no Brasil somos em sete milhões, algo como uma a cada dez mulheres em idade reprodutiva. O diagnóstico certeiro pode demorar até os 35 anos de idade.

 

"Essa demora se deve, em grande parte, ao desconhecimento da população em geral e dos médicos de que a cólica menstrual pode ser indício de endometriose", acredita Schor. "A cólica não é valorizada; muitos falam que é bobagem. Até que a mulher sente uma dor insuportável ou quer engravidar e não consegue e encontra um médico que desconfia da doença e que talvez faça o diagnóstico."

 

Além das dores constantes na pelve fora do período menstrual, alterações intestinais ou urinárias no período menstrual e dores durante as relações sexuais são os principais sintomas, diz a ginecologista Graciela Morgado. No meu caso, além de preencher todos estes requisitos, eu sentia uma dor violenta nas costas e um formigamento na perna direita, devido à compressão que um endometrioma --um cisto ovariano formado por endométrio-- fazia no aparelho urinário e nos nervos da coluna.

 

Depois de uma cirurgia equivocada, quando um ginecologista retirou o endometrioma, mas largou para trás outros vários focos espalhados da doença, de operações que tentavam a todo custo salvar meu rim, que não conseguia se esvaziar completamente, e de uma descabida e arriscada biópsia em ambiente ambulatorial, finalmente encontrei ajuda adequada de um médico especialista no problema.

 

Duas décadas e meia após minha menarca, eu finalmente descobri qual era a origem das dores incapacitantes que sentia diariamente e pude, enfim, acreditar em qualidade de vida. "A endometriose pode ser tratada com remédio ou cirurgia. Quando a doença está em estado avançado, apostar só na medicação é proibido, e é necessária a cirurgia", explica Schor. Maurício Abrão explica que, depois de operada, a chance de a mulher precisar de uma nova cirurgia é de cerca de 10%.

 

"Em muitos casos de uma suposta recidiva, o que ocorre é a persistência da doença após uma cirurgia não planejada por um especialista em endometriose, e não treinado para operar casos complexos", complementa.

 

Segundo Eduardo Schor, a briga da classe médica e das pacientes, atualmente, é pelo diagnóstico precoce. "No momento, não temos nada para oferecer. Não existe um exame de sangue para detectar a doença e os exames de imagem só pegam a doença mais avançada. A solução é o médico valorizar a cólica, ficar atento, acompanhar cada caso e, se aparecer qualquer alteração nas imagens ao longo dos meses, mudar o tipo de tratamento escolhido."



Fonte: Folha de S. Paulo | Portal da Enfermagem
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