São Paulo, 23 de abril de 2024
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Síndrome de Burnout

Paula Andréa Shinzato Ferreira Martins
Doutora em Enfermagem (EEUSP), Mestre e Especialista em Enfermagem Psiquiátrica (EEUSP/UNIFESP)
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16/06/2010

A definição de ‘Síndrome de Burnout’ foi dada pelo psicanalista nova-iorquino Herbert J. Freudenberger, no início dos anos 70, como “distúrbio psíquico de caráter depressivo, precedido de esgotamento físico e mental intenso cuja causa está intimamente ligada à vida profissional”, após constatá-la em si mesmo. Em outras palavras, esta doença pode ser traduzida como “estresse crônico laboral”.

 

Profissionais da enfermagem, assim como outros da área da saúde, estão mais predispostos a desenvolver a Síndrome de Burnout, já que trabalham direta e intensamente com pessoas em sofrimento. Para conhecer um pouco mais sobre o assunto, o Portal ouviu a enfermeira Paula Andréa Shinzato Ferreira Martins, Mestre e Especialista em Enfermagem Psiquiátrica (EEUSP/UNIFESP), Gerente de Enfermagem do Hospital Santa Catarina, em São Paulo.

 

 

 

A Síndrome de Burnout é considerada uma doença?

Sim, no decreto N° 3048/99 que regulamenta a Previdência Social, o grupo V da Classificação Internacional de Doenças (CID) 10 menciona no inciso XII a “Síndrome de Burnout, “Síndrome do Esgotamento Profissional”, também identificada como “Sensação de Estar Acabado”. O profissional tem direito a afastar-se uma vez que tenha sido diagnosticada a Síndrome.

 

 

Esta síndrome é um problema do indivíduo ou do seu contexto de trabalho? Quais são seus fatores determinantes?

A síndrome é um problema do indivíduo propiciado pelo contexto de trabalho. Podemos citar o ambiente de trabalho perverso e as relações profissionais desequilibradas. Isso engloba a longa e desgastante jornada de trabalho, o desgaste físico e emocional provocado por pressões excessivas, baixa remuneração, ausência de recompensas, falta de cooperação entre os colegas de trabalho, baixa perspectiva de ascensão na instituição e também na carreira, insegurança e ainda o já discutido “desprestígio social”.

 

 

Ela pode atingir qualquer trabalhador da Enfermagem ou é mais propícia para algumas determinadas áreas? Se sim, quais seriam estas área?

De início, esta síndrome foi observada em profissões predominantemente relacionadas a um contato interpessoal mais exigente, com vínculo assistencialista, como enfermeiros, médicos, psicólogos, assistentes sociais, professores, dentre outros. Mas, hoje, já se estende a todos os que trabalham de forma ativa com pessoas e que estão submetidas a avaliações.

A doença pode se manifestar para todas as categorias profissionais, inclusive as de Enfermagem – AE/TE/Enfº.

 

 

A síndrome também afeta graduandos: Em que estágio e por quê?

Sim, pode afetar as pessoas e não cargos e posições. Toda situação em que pese o desgaste emocional provocado pela insatisfação, pela intolerância da mesma, pode desencadear a doença. É preciso lembrar que o desgaste é proveniente do desconforto provocado por uma situação. Esta situação pode ser produzida ou não por terceiros.

 

 

Existe relação entre a Síndrome de Burnout e depressão?

Apenas pelo fato de serem transtornos mentais e apresentarem quadro semelhante, como tristeza aparente, desânimo, pessimismo, apatia geral, dificuldade em desempenhar papéis, isolamento e absenteísmo, mas a depressão é um transtorno do humor e Burnout, um transtorno ansioso. Há sintomas e sinais semelhantes, porém uma doença é diferente da outra e as causas também são diferenciadas.

 

 

“o desgaste é proveniente do desconforto

provocado por uma situação”

 

                                                            

Como reconhecer se algum colega enfermeiro apresenta sintomas da síndrome?

Por alterações no comportamento habitual dele. Irritabilidade, intolerância, apatia, tristeza, choro, desatenção, faltas recorrentes etc.

 

 

Quando e a qual profissional recorrer para buscar tratamento?

Existe muita resistência à ajuda, pois é comum negarmos um estado de fragilidade. Geralmente, a pessoa recorre a uma ajuda quando a Síndrome já está no limite, quando já está crônica. Dependendo da intensidade dos sintomas o melhor é procurar orientação médica psiquiátrica.

 

 

E como é este tratamento? A pessoa deve ficar afastada de suas atividades no ambiente de trabalho?

Dependerá da gravidade da doença no momento da busca por ajuda. É possível que o trabalhador consiga manter-se em atividade assim como é possível que ele necessite ficar afastado pelos riscos contra sua segurança e bem-estar. Ratifico que tudo dependerá do momento em que a doença for notificada e assimilada pelo profissional. Se identificada logo no início, aos primeiros sinais e sintomas, pode acontecer de somente mudanças de hábitos ou de comportamentos na rotina diária consigam reverter o quadro. Porém, se este evoluir, é necessário tratamento formal e regular. A boa maneira para superar a doença será tratar-se e manter-se no domínio de suas decisões e de seus limites.

 

 

Existe alguma ação que possa ser feita em tempo hábil para que o indivíduo não venha a desencadear a Síndrome de Burnout?

Conhecer a si mesmo é a melhor opção. Desta forma reconhecemos nossos limites, nossas predileções e intolerâncias. Também é positivo sabermos lidar com o nosso estresse e o estresse alheio. Saber qual é o ambiente que gostamos de trabalhar; com quais perfis profissionais nos desenvolvemos e nos relacionamos melhor. Conhecer como o Burnout surge e como é a sua dinâmica também são fatores positivos para evitar a doença, mas, claro, não determinantes.

 

 

Quais são as implicações de quem a desenvolve?

É possível que o trabalhador fique inseguro por algum período. Ele pode sentir-se incapaz de assumir novamente suas responsabilidades profissionais. É comum apresentar por diversas vezes atestado ou licença médica e pode ainda ficar indiferente nas decisões tomadas em conjunto com a equipe.

 

 

Também é positivo sabermos lidar

com o nosso estresse e o estresse alheio.

 

 

Você saberia dizer qual é a incidência da síndrome na Enfermagem?

Não. Não há dados registrados e divulgados. Os casos são velados e até “subnotificados”. Há pouca formalidade na divulgação deste tipo de ocorrência.

 

 

Existe algum teste que o enfermeiro possa fazer para saber se ele é uma pessoa propensa esta doença?

Entendo que cada pessoa deva se preocupar consigo e buscar compreender o que está sentindo e vivenciando. A partir dali será possível buscar ajuda, buscar escuta e encontrar o melhor atendimento de suas necessidades. É essencial que as pessoas entendam que não precisam viver com esta doença, pois há tratamento e melhora do quadro.

 

 

Curiosidade: O termo Burnout (Burn + out) alude a gíria inglesa utilizada por engenheiros aeronáuticos, desde 1940, para sintetizar o estado mecânico final de turbinas de jato que eram colocadas em “teste de resistência” até o seu limite e, então, “burnout”, ou seja, entravam em “queima total”, simplesmente, “fundiam”. Na época, no meio médico e assistencial esta gíria era empregada com a mesma analogia para designar o estado biofisiológico e psicossocial dos jovens de rua, usuários compulsivos de drogas. Nem tanto pelo uso específico das drogas, mas pelo estado deplorável de extremo comprometimento biopsicossocial a que chegavam. Posteriormente, a partir de 1974, com as pesquisas de Herbert Freudemberg, esta gíria foi também empregada para designar o estado de esgotamento físico e mental dos médicos residentes, que trabalhavam em sua equipe, apresentando claros sinais de stress crônico, relacionado diretamente com a dinâmica e ambiência do seu trabalho. Fonte: Wikipédia