São Paulo, 29 de março de 2024
Home / Notícias / Ministério da Saúde se recusa a explicar o rolo da hepatite C

Notícias

Ministério da Saúde se recusa a explicar o rolo da hepatite C

01/10/2018

Quanto mais trabalho como jornalista, mais me convenço de que os atores da esfera pública não querem esclarecer nada. O esforço geral é de confundir, como atesta o caso da patente do remédio sofosbuvir para hepatite C.

 

A notícia era boa: o Sistema Único de Saúde (SUS) poderia economizar R$ 1 bilhão comprando o medicamento genérico da estatal Farmanguinhos/Fiocruz em lugar da versão de marca da americana Gilead, detentora de patentes no exterior sobre o princípio ativo.

 

Na origem da história estão reuniões realizadas em junho e julho no Ministério da Saúde para discutir ofertas preliminares de diversos fabricantes numa possível compra de 50 mil tratamentos até 2019.

 

O relato dos encontros pode ser encontrado aqui. Nele se esclarecia que “não se tratava de um processo de aquisição”, e sim de “uma discussão de preços praticáveis com vistas a compreender os menores custos de tratamento possíveis”.

 

Surge a primeira dúvida: não é exatamente isso o que se faz num processo de licitação regular? Por que fazê-lo numa tomada de preços informal e já concluir economia de R$ 1.039.353.158,84?

 

A ata está assinada por Eduardo Seara Pojo, Adele Schwartz Benzaken e Carlos Eugênio Vasconcelos Neves, do Ministério da Saúde (MS). Eles estão na linha de frente do plano de eliminar a hepatite C do país até 2030, tratando cerca de 1 milhão de infectados que podem desenvolver cirrose e câncer e necessitar de transplante.

 

Aí veio a má notícia, no último dia 18: o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi) concedeu patente do sofosbuvir à Gilead. Inviabilizava-se a produção do genérico. Comoção geral. José Serra (PSDB) e Marina Silva (Rede) exigem explicações do governo federal. Um juiz concede liminar suspendendo decisão do Inpi.

 

Segunda dúvida: se a economia era bilionária, o Planalto não poderia licenciar compulsoriamente a droga para lançar mão do medicamento genérico? Foi o que questionou o colega Hélio Schwartsman na quarta-feira (26). Com essas e outras dúvidas levantadas após entrevista na Gilead, procurei o MS. Com três dias de antecedência, pedi entrevista em Brasília na sexta-feira, indiquei nomes de especialistas e encaminhei cinco perguntas específicas.

 

A assessoria de imprensa do MS, recorrendo a prática cada vez mais comum, enviou nota que não responde a nenhuma das questões. Quanto a entrevista, afirmava: “No momento não teremos fonte disponível”. Sobre a compra, dizia: “O processo de aquisição dos medicamentos utilizados para o tratamento da hepatite viral C e coinfecções está em andamento, portanto o Ministério da Saúde não pode se pronunciar sobre questões de preços e fornecedores, neste momento”.

 

Certo.

 

A Gilead nega que seja contra genéricos. Licenciou o sofosbuvir —voluntariamente, diz — para produção em 11 fábricas da Índia e venda em países de baixa renda. A farmacêutica alega que já ofereceu opções de nova geração ao MS, os remédios Harvoni (ledipasvir + sofosbuvir) e Epclusa (sofosbuvir + velpatasvir), com preços competitivos. Os tratamentos completos sairiam por US$ 1.490 (cerca de R$ 5.900) cada, contra US$ 1.506 (R$ 6.000) do genérico.

 

Perguntei ao MS qual sua posição sobre a decisão do Inpi, se confirmava a oferta da Gilead, se a conta do bilhão havia caducado e quando haveria uma verdadeira licitação. O público ficou sem as respostas. Essa história está muito esquisita.

 

Marcelo Leite - Jornalista especializado em ciência e ambiente, autor de “Ciência - Use com Cuidado”.



Fonte: Folha de S. Paulo | Portal da Enfermagem
Sobre Fontes Externas de Informação
Os artigos, notícias de fontes externas, assim como as imagens, publicados no Portal da Enfermagem são de total responsabilidade de seus autores e não refletem necessariamente a opinião, postura ou atitude do Portal da Enfermagem.
Além disso, possuímos uma lista prévia de veículos nacionais (jornais, revistas e sites) que costumamos replicar o conteúdo em nosso portal, sempre citando a fonte.

Comentários

O portal da Enfermagem não faz a moderação dos comentários sobre suas matérias, esse Espaço tem a finalidade de permitir a liberdade de expressão dos seus leitores, portanto, os comentários não refletem a opinião dos gestores. Apesar disso, reservamo-nos o direito de excluir palavras de baixo calão, eventualmente postadas.

Nenhum comentário enviado, seja o primeiro. Participe!