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Oxitec não soltou mosquitos suficientes para proteger Piracicaba

05/02/2018

A empresa de biotecnologia Oxitec, que comercializa mosquitos transgênicos para combater as doenças transmitidas pelo Aedes aegypti, liberou menos da metade do número de insetos considerado adequado para que Piracicaba (SP) fique protegida após o fim do contrato, que termina em maio deste ano, entre a companhia e cidade.

 

O convênio foi assinado em maio de 2016 para tratar 11 bairros da região central da cidade do interior de São Paulo. A empresa de origem britânica utiliza mosquitos geneticamente modificados, batizados de "Aedes do bem".

 

Os insetos transgênicos —todos  machos— têm um gene que faz sua descendência morrer antes de atingir a fase adulta. Assim, ao copularem com as fêmeas selvagens, eles tornam a prole inviável. Para que o efeito da intervenção seja duradouro, no entanto, a técnica precisa ser aplicada corretamente. A Oxitec recomenda aos municípios com os quais entra em contato a não realizar projetos de menos de dois anos. A justificativa é técnica. Dentro do ciclo de desenvolvimento do Aedes aegypti, formado por ovo, larva, pupa e adulto, o maior número de indivíduos está sempre no estágio de ovos.

 

Trata-se da fase de combate mais complicada, denominada etapa de supressão, já que os ovos podem se manter viáveis por cerca de um ano após serem depositados. Nesse período de um ano, é fundamental que as liberações de mosquitos transgênicos no ambiente ocorram de forma constante e em quantidade adequada.

 

Documentos fornecidos pela Prefeitura de Piracicaba mostram que, de maio de 2017 —quando a fase de supressão deveria ter começado— a outubro do mesmo ano, a Oxitec liberou semanalmente em Piracicaba menos da metade —em algumas semanas menos de um quinto— do número de mosquitos considerado adequado para que a área seja entregue, após o fim do contrato, com um impacto significativo sobre o banco de ovos.

 

Dessa forma, após a interrupção das liberações, a reinfestação da área tratada pode se dar em tempo muito curto. O efeito, assim, não seria muito diferente do combate realizado com técnicas mais rudimentares, como o uso de inseticidas, que elimina apenas uma fase do mosquito, deixando outras, como o banco de ovos, ainda presentes na área.

 

Em outro documento também fornecido pela prefeitura da Piracicaba, datado de 11 de janeiro de 2018, a Oxitec afirma que seis bairros da região central (Cidade Alta, Cidade Jardim, Clube de Campo, Nova Piracicaba, São Dimas e Vila Rezende) —onde vive mais da metade da população da área tratada— ainda estão em fase inicial de supressão. Essa etapa deveria ter começado em maio de 2017 e, portanto, ao fim do contrato, em maio de 2018, essas áreas não estarão devidamente protegidas.

 

NÚMEROS

 

Nos 11 bairros da região central de Piracicaba, onde vivem cerca de 60 mil pessoas, a empresa liberou semanalmente, de maio a outubro (veja infográfico acima), uma quantidade de mosquitos modificados que variou de 1,5 milhão a pouco menos de 6 milhões. Proporcionalmente, o número de insetos soltos variou de 25 por habitante a pouco menos de 100 por habitante.

 

Segundo a Folha apurou, no entanto, as diretrizes da área técnica preconizam uma liberação semanal de 200 mosquitos por morador, ou seja, deveriam de ter sido soltos 12 milhões de insetos modificados por semana, índice só obtido em novembro. A área do bairro Cecap/Eldorado, tratada antes da região central e que seguiu as recomendações técnicas da empresa, fornece um bom exemplo de comparação.

 

Na fase de supressão da área —onde vivem 5.000 pessoas—, que durou aproximadamente de maio de 2015 a maio de 2016, a liberação se manteve quase todo o tempo no patamar de 800 mil mosquitos (ou cerca de 160 por habitante), chegando a picos, no verão, de 1,5 milhão de insetos (300 por pessoa).

 

Projetos anteriores da empresa apresentam números semelhantes. As liberações semanais ocorridas na Ilhas Cayman, em 2010, por exemplo, variaram de cerca de 200 a 800 insetos por habitante. Em Pedra Branca (BA), em 2011, essa taxa variou de pouco mais mais de 200 a 400 mosquitos/pessoa.

 

A pesquisadora da USP Margareth Capurro, especialista em mosquitos transgênicos, analisou a taxa de liberação de insetos em Piracicaba a pedido da Folha. De acordo com ela, os níveis mostrados pela empresa provavelmente farão com que, após o fim do contrato, o trabalho feito na cidade seja perdido em pouco tempo.

 

O valor do contrato entre a Oxitec e a prefeitura de Piracicaba foi de R$ 3,7 milhões. Recentemente, a empresa assinou convênios com as prefeituras de Juiz de Fora (MG) e Indaiatuba (SP). Capurro, que há alguns anos coordenou juntamente com a Oxitec as liberações de mosquitos transgênicos em Jacobina e Juazeiro, na Bahia, porém, defende a tecnologia empregada pela empresa. "Ela funciona e pode ser aplicada ao protocolo integrado de tratamento, que também inclui medidas de saneamento básico, retirada manual de criadouros e uso de larvicidas, por exemplo."

 

OUTRO LADO

 

Em nota, a Oxitec afirmou que "cumpre seus contratos de forma regular e rigorosa, o que inclui manter a prefeitura informada". Questionado se tinha conhecimento de que as liberações de mosquitos modificados estavam abaixo do recomendado pela área técnica da empresa, o secretário de Saúde de Piracicaba, Pedro Mello, disse à Folha que a prefeitura da cidade nunca foi avisada do fato.

 

De acordo com a empresa de biotecnologia, "o projeto de supressão de vetor desenvolvido pela Oxitec não prevê liberação de quantidade fixa de mosquitos transgênicos". A menor liberação de insetos, segundo a companhia, se deu em decorrência do período do ano —inverno na maior parte—, no qual "observou-se baixa pluviosidade e baixas temperaturas (típicas da época), e, por consequência, baixa infestação do mosquito selvagem".

 

"Durante o período sazonal em que a população de mosquitos selvagens é menor, o número de mosquitos geneticamente modificados liberados pela Oxitec também foi menor. A população selvagem de mosquitos foi monitorada o tempo todo com o uso de ovitrampas espalhadas pelos bairros", afirmou a Oxitec.

 

Segundo a Folha apurou, no entanto, as baixas liberações são uma consequência de problemas industriais na produção dos insetos modificados ocorridos na fábrica construída pela companhia em Piracicaba. De acordo com a empresa, "o projeto da Oxitec em Piracicaba foi o primeiro em escala operacional que adotou essa estratégia de adequação sazonal no número de mosquitos".

No caso do bairro Cecap/Eldorado, o primeiro tratado pela companhia em Piracicaba (a partir de maio de 2015), a questão da sazonalidade não teve o mesmo peso. Lá, as liberações semanais na fase de supressão realizada durante o inverno estiveram no patamar de 160 mosquitos transgênicos por habitante.




Fonte: Folha de S. Paulo | Portal da Enfermagem
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